Morte de Helinho Coelho é uma perda de lucidez de uma Campos que fica cada vez mais pobre
Por Arnaldo Garcia
O município de Campos dos Goytacazes, surrupiado pela medrosa pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica (IBGE), acaba de ficar mais pobre. Se na quantidade somos mal contados, na qualidade essa conta é exatamente diferente. Sim, pois o quanto temos de bons pensamentos, de verdadeirismo, coragem e até de história pura em suas vertentes, o tempo ou o acaso vai tomando e "roubando" isso de nós campistas apaixonados por esse rincão de Benta Pereira, Patrocínio, Nilo e tantos outros mais recentes, como Helinho Coelho.
A história desse Campos dos Goytacazes perdeu um contador e personagem dos mais importantes. O professor, advogado, historiador, político e destemido Helinho, ou Dr. Hélio de Freitas Coelho, faz parte desses últimos 75 anos de avanços e retocessos dessas plagas goytacazes. Um homem, uma história! E quão legado importante nos deixa esse intelectual vocacionado para o povo, o seu povo campista. Um ser que cultivava a máxima popular, de que "uma andorinha não faz verão", mas, que também sabía que, "uma revolução começa com cada um de nós".
É assim que tenho, na memória, esse ser histórico para minha vida, que, de certa forma, me inspirou na minha formação de centro esquerda. Sim, é possivel ser ponderado politicamente, saber dizer não quando as medidas já passam da tolerância de estar do lado para tentar auferir o melhor para o seu semelhante, para sua gente, por mais que este lado não corrensponda a sua formação política. Mas, havia uma possibildade de influência para o bem. Isso é acreditar em si, sem menosprezo e sem medo de cair em contradição. Por isso, em dado momento, ao vislumbre de algo que preenchia a alma e ao saber, veio a ruptura, para lutar em outras trincheiras. Aquela que vinha da formação e da alma, a verdadeira.
Não tive convívio direto com o ex vereador, mas se não falha a lembrança, até porque era muito garoto, participou de um movimento de juventude do qual faziam parte Amadeu Chácar Filho e Manoel Martins Neto, ambos, também, não mais entre nós. Eram os revolucionários de uma Câmara Municipal conservadora nos tempos do bipartidarismo (Arena e MDB), mas alí democráticos e visionários.
Separei, sem a licença dos autores, textos que enfatizam bem a história de Helinho Coelho, além desse modesto (Helinho merece muito mais) depoimento acima, e agradeço aos jornalistas - dos quais sou fã - Ricardo André Vasconcelos e Aloysio Abreu Barbosa.
Depoimentos
Das virtudes de Helinho Coelho já decantadas neste momento de passagem trago mais uma: coragem cívica.
De família de políticos — o pai, Edgard Coelho dos Santos, foi vereador entre 1950 e 1958 e o tio, Edson Coelho dos Santos teve longeva carreira na vereança — Hélio Coelho foi eleito vereador para seu único mandato em meados dos anos 70 e chegou à Presidência da Câmara. Foi eleito pela Arena, partido que era o arrimo político da ditadura, o que não o impediu de trazer a Campos um dos principais adversários do regime, o deputado federal Ulysses Guimarães, então presidente do MDB para um comício pela Anistia aos presos políticos.
A filiação à Arena não tinha nada de ideológico, pois toda linhagem Coelho tem raízes trabalhistas e Helinho, militou na esquerda democrática até o último suspiro.
Me lembro de quando um grupo de jovens do qual eu fazia parte que saia às madrugadas para pichar os muros da cidade com “abaixo a ditadura!”; todos levávamos no bolso um número de telefone para o caso de ser flagrado pela Polícia. Era o telefone do vereador, professor e advogado Hélio Coelho que, à época, cultivava um vistoso bigode negro com as pontas para cima, como Nilo Peçanha, a quem devotava justificada admiração.
Anos depois, precisamente em 1982, Helinho deu outra demonstração de seu desassombro e independência. Naquele ano, já nos estertores dos “anos de chumbo” e alvorecer do retorno à democracia, haveria eleição direta para governadores, deputados estaduais, deputados federais, prefeitos (exceto das capitais) e vereadores, com detalhe que o voto era vinculado, ou seja, o eleitor era obrigado a votar em candidatos de um mesmo partido para todos os cargos, sob pena de nulidade do voto.
Para o governo do Estado a ex-deputada Sandra Cavalcanti (PTB ressuscitado mas alinhado ao Planalto fardado) liderava com folga a disputa pela sucessão do então governador Chagas Freitas e Hélio Coelho era o candidato do partido à Prefeitura de Campos. Mas as posições da candidata, lacerdista histórica e abertamente conservadora, constrangia Helinho que evidentemente tinha muito mais pontos convergentes com o candidato do recém criado PDT, Leonel Brizola.
Pois foi num comício de Brizola na Praça do Santíssimo Salvador que Helinho renunciou sua candidatura para apoiar Brizola, ainda patinando nas pesquisas eleitorais. A reação do PTB local foi violentíssima e a sede do partido na Rua Alberto Torres foi pichada xingando-o de “traidor”.
No meio da multidão e um dos destinatários do discurso, ouvi e guardei na memória aquele momento histórico:
— Eu não tinha mais coragem de olhar nos olhos dos meus alunos e manter uma candidatura atrelada a uma candidata com a qual não concordo, não comungo de seus ideais. Por isso, renunciou a minha candidatura para, a partir de agora, me juntar a campanha do senhor, Leonel Brizola.
Ali, além do respeito, que já tinha, ganhou minha admiração para sempre e foram várias as vezes que revisitamos esse episódio que, inclusive, constava de um projeto meu de escrever um livro sobre a história política de Campos e que tinha início exatamente nesse comício. Dali eu retrocederia até a eleição de José Alves de Azevedo na de década de 50 e contaria (já como testemunha) os trinta anos seguintes àquela noite e 1982.
Mas isso é outra história...
PS.: entre a renúncia à candidatura e a volta a vida pública como Secretário de Governo nas administrações Garotinho Sergio Mendes, Helinho foi diretor do Presídio de Campos, na subida da Ponte General Dutra e que era o único da região à época. Muita gente estranhou nomear um humanista convicto para dirigir um presídio, mas por óbvio, quem melhor para dirigir um presídio que um humanista convicto?
Ricardo André Vasconcelos
Helinho Coelho entre agregador e milagreiro:
Falecido ontem, com o corpo sepultado no final da manhã de hoje, no Cemitério do Caju, o professor e ex-vereador Hélio de Freitas Coelho foi conhecido em seus 75 anos de vida como um agregador. Mas talvez nem ele pudesse supor o quanto esse seu dom de juntar pessoas por vezes opostas é poderoso. Na manhã de hoje, em seu velório na Câmara Municipal de Campos, Helinho foi capaz de agregar o ex-governador Anthony Garotinho (União) e o presidente do Legislativo goitacá, Marquinho Bacellar (SD). Que é conhecido por ser um inflamado antigarotista. Milagres de Helinho!
Aloysio Abreu Barbosa
Helinho Coelho, um dos maiores campistas que conheci, grande pensador, como Dr. Jorge Renato Pereira Pinto, e meu amigo de 81 anos, Francisco Armando Lacerda Almeida (Dr. Lacerda).